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Mais de 70% dos entrevistados em pesquisa do IBGE já trabalhavam antes dos 17 anos



Dado é grave e coincide com abandono e atraso escolar, aponta secretária executiva do FNPETI

Por Cássia Almeida e Lucianne Carneiro
O Globo, em 17.11.2016

Mais de 70% (73,9%) da população que foi alvo da pesquisa do IBGE (pessoas de 16 anos ou mais ocupados e que os pais trabalhavam) começaram a trabalhar até os 17 anos. Isso representa um total de 51,2 milhões das 69,3 milhões de pessoas pesquisadas. Um terço dessa população (36,4%, o que significa 25,2 milhões) começou a trabalhar ainda criança, até os 13 anos, numa mostra clara da extensão do trabalho ilegal.

“O trabalho precoce prejudica radicalmente a vida. Ele marca a carreira do jovem, que dificilmente vai conseguir se livrar dessas correntes. Muitos abandonam os estudos, entram em condição de subemprego e ficam presos a serviços extenuantes por toda a vida”, afirma o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara.

Ao todo, quase 90% dos pesquisados (89,8%) começaram a trabalhar até os 19 anos. No ano da pesquisa (2014), 3,3 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos trabalhavam no Brasil e 70% não poderiam estar no trabalho. Até os 13 anos, o trabalho é proibido por lei. Na faixa de 14 a 17 anos, dos 2,8 milhões ocupados, apenas 500 mil eram aprendizes ou com carteira assinada.

“As ações fiscais mostram que esses adolescentes estão em atividades penosas, perigosas, degradantes. Isso influencia a situação de vida e a saúde desses adolescentes”, diz Isa de Oliveira, secretária-executiva do Fórum Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil.

Atraso escolar

Entre esses adolescentes de 15 a 17 anos que trabalham, somente 70% conseguem estudar, outra barreira para ascensão social. No total, a frequência é de 84,3%.

“Em qualquer pesquisa, qualquer recorte, essa situação aparece. É um dado grave, coincide com abandono escolar, maior repetência, atraso escolar. Numa dimensão maior, os empresários não vão conseguir qualificar a mão de obra. Sem escolaridade básica, não há como qualificar nenhum jovem para o trabalho”, comenta Isa de Oliveira.

Uma das distorções do ensino no país, segundo a diretora-executiva do movimento Todos pela Educação, Priscila Cruz, é a própria existência do ensino médio regular noturno. “Trabalhar compete em foco e atenção com estudo. Talvez o único caso em que se poderia considerar é no ensino técnico, mas já após os 16 anos.”

A entrada precoce no mercado de trabalho se mostra mais intensa no caso de filhos de trabalhadores agrícolas, que tendem a recorrer mais ao apoio dos descendentes no trabalho. Por outro lado, aqueles cujos pais eram profissionais das ciências e das artes — como engenheiros, enfermeiros e professores — são os que começaram a trabalhar mais tarde.

Entre aqueles que os pais eram agricultores, a proporção dos que começaram a trabalhar até os 13 anos sobe para 59,6%. Na faixa de 14 a 17 anos, a taxa é de 26,7%. Entre os filhos de pais com trabalho na área de ciência e artes, apenas 7,5% entraram no mercado até os 13 anos, enquanto 30,8% começaram a trabalhar entre 20 e 24 anos.

Para além das ocupações, outro fator de forte influência para que os filhos comecem a trabalhar mais cedo é a falta de vínculo empregatício dos pais. Entre aqueles cujos pais não tinham carteira assinada na idade de 15 anos, quase metade (46,6%) entrou no mercado de trabalho até os 13 anos. A taxa é a mesmo no caso daqueles com pais que trabalhavam por conta própria. A taxa fica muito acima da média, que é de 36,4%.

Com uma situação mais precária dos pais, essas crianças precisam contribuir para o orçamento da família. Como reflexo da mesma tendência, entre aqueles cujos pais eram trabalhadores com carteira assinada, a proporção dos que começam a trabalhar até os 13 anos era menor, de 19,9%. Entre filhos de militares e funcionários públicos, a parcela é ainda menor, de 15,2%.

Quando se considera a entrada no mercado de trabalho até os 17 anos, a taxa é de 66,5% para aqueles cujos pais tinham carteira de trabalho assinada e de 82,5% para os que não tinham carteira.

“A entrada precoce no mercado de trabalho está fortemente relacionada à posição dos pais na ocupação. Entre aqueles cujos pais não tinham carteira ou trabalhavam por conta própria, os filhos começam a trabalhar mais cedo”, explica a analista da Coordenação de Trabalho e Rendimento do IBGE Flávia Vinhaes Santos.

Fonte: FNPETI

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